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TEMPO PASCAL. TERCEIRA SEMANA. SEXTA-FEIRA

66. A COMUNHÃO DOS SANTOS

– Comunidade de bens espirituais. O “tesouro da Igreja”.

– Estende-se a todos os cristãos. Ressonância incalculável das nossas boas obras.

– As indulgências.

I. NA PRIMEIRA LEITURA da Missa de hoje, relata-se um fato fundamental da vida de São Paulo, que ficaria gravado para sempre na sua alma: Quando estava já perto de Damasco, aconteceu que se viu subitamente rodeado de uma luz resplandecente vinda do céu. Caindo por terra, ouviu uma voz que lhe dizia: Saulo, Saulo, por que me persegues? Saulo disse: Quem és, Senhor? E ele respondeu: Eu sou Jesus, a quem tu persegues1. Nesta primeira revelação ao Apóstolo, Jesus mostra-se pessoal e intimamente ligado aos seus discípulos, a quem Paulo perseguia.

Mais tarde, quando expuser a doutrina do Corpo Místico de Cristo, um dos temas centrais da sua pregação, Paulo falará da união profunda que liga os cristãos entre si, por estarem unidos à Cabeça que é Cristo: Se um membro sofre, todos os membros sofrem com ele; se um membro é honrado, todos os outros se alegram com ele2.

Esta fé inquebrantável na união dos fiéis entre si levava o Apóstolo a pedir aos primeiros cristãos de Roma, a quem ainda não conhecia pessoalmente, que rezassem para que Deus o livrasse dos incrédulos que ia encontrar na Judéia3. Sentia-se muito unido aos seus irmãos na fé, e chamava-os santos nas suas cartas: Paulo e Timóteo, servos de Jesus Cristo, a todos os santos em Jesus Cristo que se acham em Filipos4. Já nos primeiros tempos da Igreja, os cristãos, ao rezarem o Símbolo Apostólico, proclamavam como uma das principais verdades da fé: Creio na Comunhão dos Santos.

A Comunhão dos Santos consiste numa comunidade de bens de que todos se beneficiam. Não é uma participação em bens deste mundo, materiais, culturais, artísticos, mas uma comunidade de bens imperecíveis, que nos permite prestar uns aos outros uma ajuda incalculável. Hoje, se oferecermos ao Senhor o nosso trabalho, a nossa oração, a nossa alegria e as nossas dificuldades, poderemos fazer muito bem a pessoas que estão longe de nós e à Igreja inteira.

“Vivei uma particular Comunhão dos Santos. E cada um sentirá, à hora da luta interior e à hora do trabalho profissional, a alegria e a força de não estar só”5. Santa Teresa, consciente dos estragos que os erros protestantes causavam dentro da Igreja, sabia também deste apoio que podemos prestar uns aos outros: “Andam as coisas do serviço de Deus tão desfavorecidas que é mister aos que o servem arrimarem-se uns aos outros, para irem adiante”6. E sempre se viveu esta doutrina no seio da Igreja7.

“Que significa para mim a Comunhão dos Santos? Significa que todos os que estamos unidos em Cristo – os santos do Céu, as almas do purgatório e os que ainda vivemos na terra – devemos ter consciência das necessidades dos outros. Os santos do Céu [...] devem amar as almas que Jesus ama, e o amor que têm pelas almas do purgatório e pelas almas da terra não é um amor passivo. Os santos estão ansiosos por ajudar a caminhar para a glória essas almas cujo valor infinito estão agora em condições de apreciar como antes não podiam. E se a oração de um homem bom na terra pode mover o coração de Deus, como não será a força das orações que os santos oferecem por nós! Eles são os heróis de Deus, seus amigos íntimos, seus familiares”8.

II. A COMUNHÃO DOS SANTOS estende-se até aos cristãos mais abandonados. Por mais só que se encontre, um cristão sabe muito bem que jamais morre só: toda a Igreja está a seu lado para devolvê-lo a Deus, que o criou.

A Comunhão dos Santos suplanta o tempo. Cada um dos atos que realizamos na caridade tem repercussões ilimitadas. No dia do Juízo, compreenderemos as ressonâncias incalculáveis que puderam ter na história do mundo as palavras, as ações ou as instituições de um santo, como também as nossas.

Todos precisamos uns dos outros, todos podemos ajudar-nos. Na verdade, todos participamos continuamente dos bens espirituais comuns da Igreja. Neste momento, alguém está rezando por nós e a nossa alma se está vitalizando pelo sofrimento, pelo trabalho ou pela oração de pessoas que talvez desconheçamos. Um dia, na presença de Deus, no momento do juízo particular, ficaremos a conhecer essas imensas contribuições que nos impediram de soçobrar ou nos ajudaram a situar-nos um pouco mais perto de Deus.

Por outro lado, se formos fiéis, também perceberemos com imensa alegria como foram eficazes para outras pessoas todos os nossos sacrifícios, orações e trabalhos, incluídos aqueles que, no momento em que os fazíamos, nos pareceram estéreis e de pouco interesse. Talvez vejamos como houve pessoas que se salvaram devido em boa parte à nossa oração, à nossa mortificação e às nossas obras.

De modo particular, vivemos e participamos desta comunhão de bens através da Santa Missa. A unidade de todos os membros da Igreja, mesmo dos que estão mais longe, aperfeiçoa-se todos os dias em torno do Corpo do Senhor, que se oferece pela sua Igreja e por toda a humanidade. “Pela Comunhão dos Santos, todos os cristãos recebem as graças de cada Missa, quer se celebre perante milhares de pessoas ou tenha por único assistente um menino, talvez distraído”9.

São Gregório Magno expõe em termos muito expressivos e pedagógicos a eficácia maravilhosa da Santa Missa. “Parece-me – diz o Santo Doutor numa das suas homilias – que muitos dos que me ouvem conhecem o episódio que vou recordar. Conta-se que certa vez um homem foi feito prisioneiro dos seus inimigos e conduzido a um lugar muito distante da sua pátria. E como passava o tempo e sua mulher via que não regressava do cativeiro, deu-o por morto e oferecia sacrifícios por ele todas as semanas. E todas as vezes que a sua mulher oferecia sacrifícios pela absolvição da sua alma, outras tantas se soltavam os grilhões do seu cativeiro. Quando mais tarde regressou à sua cidade, contou com admiração à esposa como as correntes que o prendiam no calabouço se soltavam, por si sós, em determinados dias da semana. Sua mulher, considerando os dias e as horas em que isso acontecia, tanto quanto ela pôde recordar, reconheceu que seu esposo ficava livre quando era oferecido pela sua alma o Santo Sacrifício”10. Muitas correntes se quebram todos os dias graças às orações dos outros.

III. A UNIDADE INVISÍVEL da Igreja tem múltiplas manifestações visíveis. Um dos momentos privilegiados desta unidade tem lugar no sacramento que recebe precisamente o nome de Comunhão, nesse augusto Sacrifício que é o mesmo e único em toda a terra. Um só é o sacerdote que o oferece, uma a Vítima, um o povo que também o oferece, um só o Deus a quem se oferece, um só o resultado da oferenda: Uma vez que há um único pão, nós, embora sendo muitos, formamos um só corpo, porque todos nós comungamos do mesmo pão11. Assim como no dia de ontem este pão era apenas um punhado de grão soltos, assim os cristãos, na medida da sua união com Cristo, fundem-se num só corpo, ainda que provenham de lugares e condições bem diversas. “O sacramento do pão eucarístico – afirma o Concílio Vaticano II – significa e realiza a unidade dos fiéis que constituem um só corpo em Cristo”12. É “o sacramento da caridade”13, que exige a união entre os irmãos.

É também verdade de fé que esta comunicação de bens espirituais existe entre os fiéis que constituem a Igreja triunfante, padecente e militante. Podemos colocar-nos sob a proteção e receber ajuda dos santos (canonizados ou não) que já estão no Céu, dos anjos, das almas que ainda se purificam no purgatório (cujo fardo também podemos ajudar a aliviar, daqui da terra) e dos nossos irmãos que, como nós, peregrinam em direção à pátria definitiva. Quando cumprimos o piedoso dever de rezar e oferecer sufrágios pelos defuntos, devemos lembrar-nos especialmente daqueles com quem mantivemos vínculos mais estreitos aqui na terra: pais, irmãos, amigos, etc. Eles contam com as nossas orações. A Santa Missa é também o sufrágio mais importante que podemos oferecer pelos defuntos.

Baseia-se também no dogma da Comunhão dos Santos a doutrina das indulgências. Através delas, a Igreja administra com autoridade as graças alcançadas por Cristo, pela Virgem Maria e pelos santos; e, desde que se verifiquem certas condições, emprega essas graças para satisfazer pela pena devida pelos nossos pecados, como também pela das almas que estão no purgatório.

A doutrina sobre este intercâmbio de bens espirituais deve ser para nós um grande estímulo para rezarmos com devoção, para cumprirmos com fidelidade os nossos deveres e oferecermos a Deus todas as nossas obras, sabendo que todos os nossos trabalhos, doenças, contrariedades e orações constituem uma ajuda formidável para os outros. Nada se perde daquilo que fizermos com retidão de intenção. Se vivêssemos melhor esta realidade da nossa fé, a nossa vida estaria cheia de frutos.

“Um pensamento que te ajudará nos momentos difíceis: quanto mais aumentar a minha fidelidade, melhor contribuirei para que os outros cresçam nesta virtude. – E é tão atraente sentirmo-nos sustentados uns pelos outros!”14

Pode animar-nos a viver melhor este dia o pensamento de que alguém está intercedendo por nós neste instante, e de que alguém espera a nossa oração para sair de uma má situação ou para decidir-se a seguir mais de perto o Senhor.

(1) At 9, 3-5; (2) 1 Cor 12, 26; (3) Rom 15, 30-31; (4) Fil 1, 1; (5) Josemaría Escrivá, Caminho, n. 545; (6) Santa Teresa, Vida, 7-8; (7) cfr. Santo Inácio de Antioquia, Carta aos Efésios, 2, 2-5; São Cipriano, Carta 60; São Clemente, Carta aos Corintios, 36, 1 e segs.; Santo Ambrósio, Tratado sobre Caim e Abel, 1 e segs.; (8) L. J. Trese, A fé explicada, 4ª ed., Quadrante, São Paulo, 1987, pág. 135; (9) Josemaría Escrivá, É Cristo que passa, n. 89; (10) São Gregório Magno, Homilia sobre os Evangelhos, 37; (11) 1 Cor 10, 17; (12) Conc. Vat. II, Const. Lumen gentium, 3; (13) São Tomás, Suma Teológica, 3, q. 73, a. 3; (14) Josemaría Escrivá, Sulco, n. 948.

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